O juiz de Goiás que mandou anular casamento gay
Jeronymo Villas Boas(foto) contrariou a decisão do Supremo de aceitar a união
estável de pessoas de mesmo sexo. E afirma que vai tomar a mesma decisão sempre
que houver casos semelhantes.
O juiz de Goiás que mandou anular um casamento
gay deu uma entrevista exclusiva ao Fantástico. Assista:
Uma assinatura histórica. Se dependesse do casal
homossexual que casou em Goiás duraria para sempre. “Foi aquela muvuca no
cartório porque foi a primeira do Brasil”, contou.
Mas durou pouco mais de um mês. A primeira união
estável entre pessoas de mesmo sexo foi anulada por um juiz em Goiânia. “Ele
comparou o nosso ato para o cartório como um ato criminoso, de um roqueiro que
tira a roupa durante um show no palco”, diz o jornalista Léo Mendes.
Odílio e Léo foram ao Rio de Janeiro fazer outra
escritura de união estável. “Sim! E não já juiz nesse país que irá nos separar”,
disse Léo, no momento do sim.
A cerimônia se transformou em um protesto
coletivo: 43 casais homossexuais firmaram compromisso em cartório, inclusive,
Odílio e Léo.
Mas eles nem precisavam ter viajado. A
corregedora de Justiça de Goiás Beatriz Figueiredo Franco anulou a sentença do
juiz e deu validade ao primeiro documento assinado pelo casal. “Eu achei por bem
tornar sem efeito a decisão, dado o alcance administrativo que esta
significava”, diz a corregedora.
O Fantástico foi a Goiás encontrar o juiz
Jeronymo Villas Boas que contrariou a decisão do Supremo Tribunal Federal de
aceitar a união estável de pessoas de mesmo sexo. A equipe de reportagem chegou
no momento em que ele recebia a notificação da corregedoria, revendo a
sentença.
Perguntado sobre se não teria medo de uma
punição, ele responde: “Medo não faz parte do meu vocabulário”.
Quem é o juiz que discordou do Supremo Tribunal
Federal?
Repórter: O senhor é homofóbico?
Juiz: De modo algum.
Mineiro de Uberaba, 45 anos, casado, pai de dois
filhos e vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros. Jeronymo
Villas Boas é juiz há 20 anos e diz que se baseou na lei para tomar sua decisão.
“O que neste ato pretenderam os dois declarantes é obter a proteção do Estado
como entidade familiar. Os efeitos jurídicos que se extrairia disso são efeitos
jurídicos de proteção da família. Eles não são uma família”, afirma.
Ele argumenta que se ateve ao conceito de família
definido pela Constituição brasileira: “Declara no artigo 16 que constitui
família o núcleo formado entre homem e mulher. E dá a esse núcleo uma proteção
especial como célula básica da sociedade. Família é aquele núcleo capaz de gerar
prole”.
Para o juiz, a união estável de pessoas de mesmo
sexo contraria esse conceito constitucional. Na opinião dele, casais gays não
teriam como constituir nem família nem estado. “Se você fizer um experimento,
levando para uma ilha do Pacífico dez homossexuais e ali eles fundarem um
Estado, sob a bandeira gay, e tentarem se perpetuar como Estado, eu acredito que
esse Estado não subsistiria por mais de uma geração”, argumenta.
A posição do juiz vai contra a interpretação do
Supremo Tribunal Federal sobre o que é uma família. O ministro-relator Ayres
Britto disse que a Constituição apenas silencia e, portanto, não proíbe a união
homoafetiva. Em linguagem poética, o relatório dele, aprovado por unanimidade,
diz que família é um núcleo doméstico baseado no afeito. E que os “insondáveis
domínios do afeto soltam por inteiro as amarras desse navio chamado
coração”.
Desde o ano passado, o juiz Jeronymo Villas Boas
é também pastor da Igreja Assembleia de Deus, que frequenta toda semana. Para os
que o acusam de fundamentalismo religioso, Jeronymo Villas Boas diz que já tomou
decisões contra a sua própria igreja, negando pedidos de isenção de impostos. E
afirma ter outras inspirações: “As pessoas, talvez, possam querer me criticar
porque eu tenho uma forte influência marxista”, diz o juiz.
De Marx, o fundador do comunismo, a Martin Luther
King, de quem tem um imenso painel. “O Martin Luther King foi um defensor da
igualdade racial, mas também foi um defensor da família”, ele destaca.
Em uma biblioteca contígua ao gabinete dele,
Jeronymo mostra à equipe de Vinicius de Moraes, ao famoso ensaio do psicanalista
Roberto Freire sobre o desejo, e até uma bíblia em hebraico.
Diz que lê de tudo, sem preconceito. Mas não nega
a influência de seus princípios religiosos. “A Constituição brasileira foi
escrita sob a proteção de Deus. Querer que um juiz, que professa a fé
evangélica, não decida questões que envolva conflitos, muitas vezes, de natureza
política, social ou religiosa é negar a independência do juiz”, ele pondera.
E afirma que vai tomar a mesma decisão sempre que
houver casos semelhantes. “Já solicitei de todos os cartórios que me remetam os
atos que foram praticados a partir de maio deste ano para análise”, avisa.
O repórter pergunta se ele sabe que irá enfrentar
uma briga e Jeronymo responde: “Não há problema. Se o juiz tiver medo de
decidir, tem que deixar a magistratura. Juiz medroso ou covarde não tem condição
de vestir a toga”.
Já quando perguntado sobre o que fará se for
enquadrado pelos superiores, argumenta: “Eu tenho direito de defesa. Se me
punirem sem o direito de defesa, nós entramos no regime de exceção”, afirma.
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal,
se diz perplexo com a atitude de Villas Boas. Para o ministro, nenhum juiz está
acima das orientações do Supremo. “No meu modo de ver, a reiteração dessa
prática por esse magistrado vai revelar a postura ostensiva de afronta à Suprema
corte. Isso efetivamente vai desaguar em um processo disciplinar junto ao
Conselho Nacional de Justiça”, alerta Fux.
Fonte Fantastico / clarinrn
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